Na reta final da década 80, mais precisamente em 1988, a torcida do Botafogo amargava dois tabus que não condiziam com o passado glorioso do clube. Vinte anos sem títulos e dois sem vencer clássicos no Rio de Janeiro (o último havia sido um 2 X 1 contra o Flamengo, em maio de 86). Para o Estadual daquele ano, a diretoria alvinegra, tendo à frente o “patrono” e dublê de vice-presidente de futebol Emil Pinheiro, resolveu investir pesado. Trouxe de uma tacada só Mauro Galvão, Paulinho Criciúma, Marinho e Claudio Adão, do Bangu (era o fim de uma época de ouro banguense); o goleiro Alvez, da seleção uruguaia; e o ponta-esquerda Éder, ex-craque do Galo Mineiro.
Para a estreia do campeonato, contra o Volta Redonda, a torcida alvinegra fez festa e lotou o estádio de São Januário (o Maracanã estava ocupado por Fla e Vasco). Dez entre dez botafoguenses acreditavam que 88 seria o ano da redenção. O alvinegro sairia da fila. E de quebra ainda venceria uma penca de clássicos. No primeiro jogo a vitória veio tranquila: 2 X 0. Mas no restante do campeonato nada deu certo.
Foram três derrotas e três empates em clássicos e um inacreditável quinto lugar na classificação final do Carioca. Até o Americano, do endiabrado ponta-direita Amarildo, ficou na frente do alvinegro. Lembro-me de duas derrotas acachapantes do Botafogo naquele ano: uma para o Vasco (que conquistou o bi estadual), por 3 X 0, e outra de 2 X 0 para o Fluminense. Ambas com direito a olé dos adversários e o escambau.
E depois do vexame de 88 - o desempenho do time na Copa União também foi pífio -, o que fazer para 89? A estratégia óbvia de contratar jogadores de peso já tinha falhado e a experiência recente de elencos medíocres traumatizava até o mais otimista dos alvinegros. Acabou que nada de especial foi feito. A base do elenco foi mantida, jogadores pouco conhecidos chegaram, jovens foram promovidos e um novo técnico contratado: o campeão mundial (pelo Grêmio, em 83) Valdir Espinosa.
A Taça Guanabara daquele ano foi parar na Gávea, embora o Botafogo tenha feito de tudo para impedir. O returno foi dominado pelo glorioso quase de ponta a ponta. Mas na hora da decisão... Bastava uma vitória contra o Bangu, numa tarde de sábado, no Maracanã, para o título ficar em Marechal Hermes (a sede de General Severiano, na época, ainda estava com a Companhia Vale do Rio Doce). Só que o onze alvinegro sentiu o peso de um Maracanã cheio, se atrapalhou com a retranca adversária, e o placar não saiu do zero. Restava torcer pelo eliminado Vasco contra o Flamengo no dia seguinte.
Como tem coisas que só acontecem com o Botafogo, o domingo foi de dilúvio no Rio de Janeiro e a rodada foi adiada para segunda-feira. Mais vinte quatro horas de angústia. Só que dessa vez a história teve final feliz: com gols de Roberto Dinamite e do lateral Paulo Roberto (contra um de Bebeto), o Vasco venceu por 2 X 1 e finalmente o Botafogo pode levar uma tacinha para sua sala de troféus.
Um registro importante: o alvinegro, ainda invicto, não tinha vencido um clássico sequer na competição. Foram seis empates. Alguns deles incríveis. Lembro de um contra o Flamengo onde o árbitro Luís Carlos Félix encerrou o jogo quando Paulinho Criciúma daria a tão sonhada vitória ao Botafogo. Em outra ocasião, o time do técnico Espinosa chegou a fazer 2 X 0 em um medíocre Fluminense. Parecia certo que a escrita terminaria ali. Mas não terminou. Aos trancos e barrancos, o tricolor conseguiu um empate heróico: 2 X 2.
E veio a primeira partida da final contra o Flamengo. Um 0 X 0 monótono e o sétimo empate seguido em clássicos. Apesar da decepção, o placar era favorável ao Botafogo que, por ter realizado melhor campanha durante o campeonato, jogava por resultados iguais. Incrível, mas o alvinegro poderia ser campeão e ao mesmo tempo completar três anos sem vencer seus rivais locais.
Mas não foi assim que 89 entrou para a história. Na noite de quarta-feira, 21 de junho, um total de 68.671 torcedores presenciou, aos 12 minutos do segundo tempo, o gol épico do ponta-direita Maurício. Falta no rubro-negro Leonardo? Pouco importa. Terminava ali um jejum de vinte e um anos, doze dias, quatro horas e 30 minutos sem títulos e de mais de três anos sem vitórias em clássicos.
Os heróis botafoguenses naquela inesquecível jornada foram: Ricardo Cruz, Josimar, Wilson Gottardo, Mauro Galvão e Marquinhos; Carlos Alberto Santos, Luisinho, Vitor e Paulinho Criciúma; Maurício e Gustavo (Mazolinha).
No ano seguinte, o Botafogo ainda conquistaria o seu último bicampeonato estadual. Lembram do gol de Carlos Alberto Dias? Da volta olímpica vascaína com uma caravela ridícula? Do título decidido no tribunal? O escriba aqui também lembra, mas aí já é história para, quem sabe, uma outra crônica...